Alfredo Bessow

Alfredo Bessow é um jornalista, radialista, influenciador e analista político brasileiro com mais de 40 anos de experiência.

O que o governo precisa e pode aprender com o episódio do “mula” voador?

por | 27/06/2019 | 0 Comentários

Não é oportuno repetir a estratégia de grupos políticos que optaram por reinventar a realidade como forma de se protegerem, no presente, do próprio passado

O episódio do militar brasileiro preso na Espanha com um carregamento de 39kg de cocaína e as características nas quais o “produto” se encontrava – sem nenhum tipo de ocultação entre roupas ou mesmo dissimulação – é oportuno para muitas teorias conspiratórias, para muitas ilações e deve servir para que as autoridades repensem os protocolos de segurança e certas estratégias de gerenciamento de pessoal.

Não há como atentar para o fato de que até parece ter sido coisa encomendada, plantada – como parte de uma missão, etapa de uma estratégia. Inclusive o fato de as informações serem ardilosamente contraditórias, incompletas, inconclusas e tendenciosas.

A constatação de que o sujeito fazia parte do grupo quase
permanente da FAB para o atendimento das demandas oficiais – sabe-se, pelos
registros, que ele atuou/esteve presente em voos de ministros e comitivas
presidenciais desde os tempos de Dilma – revela que se tratava de pessoa já
conhecida, que provavelmente tenha conquistado a confiança da estrutura.

E nesse ponto, abre-se uma interrogação sobre os protocolos
de segurança que o GSI – Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da
República – não utilizou. Essa é a questão que realmente me deixou pasmo: e se
em lugar de cocaína ele tivesse levado uma arma ou um explosivo, nesse ou em
algum outro voo diretamente da comitiva de algum dirigente do País?

É de se perguntar como alguém – mesmo tendo conquistado toda
a confiança da entourage – embarca em um voo sem passar por detector de metais,
Raio X da bagagem e outros procedimentos operacionais aos quais nós somos
submetidos antes de qualquer embarque? É preciso deixar claro que o “Grupamento”
da FAB é uma estrutura perene e que não é montada ou remontada por cada
presidente ou comandante do GSI. Supõe-se que são pessoas recrutadas com zelo,
em uma esfera muito próxima do comando central e das decisões políticas do
país.

A despeito de eventuais falhas na estrutura decorrentes de
vacilos, de brechas ou de compadrio entre os integrantes do grupo, trata-se de oportunidade
para rever os protocolos de segurança, de manutenção de equipes, de recrutamento
de pessoal, de vistorias, de acompanhamento da vida de quem está em uma posição
assim tão estratégica. Que se aproveite o incidente para mostrar que de onde
menos se espera, dali é que costumam surgir ensinamentos, uma vez que talvez
esteja na hora de avaliar e analisar muitos outros procedimentos rotineiros e
que podem estar com “fadiga” de rotinas.

No entanto, ao menos para mim, o que o episódio mostrou de
mais preocupante foi mais uma vez a bateção de cabeça no que tange a divulgação
de informações sobre o que realmente aconteceu. É inacreditável que, decorridos
seis meses da posse do presidente Jair Bolsonaro, a parte da comunicação
continue sendo feita sem coordenação, de modo empírico e sob o primado do
amadorismo e do espontaneísmo.

A prisão do “mula” aéreo agora é da alçada da justiça para
investigar. As falhas de segurança operacional devem sim ser assumidas pelo
GSI. O que eu me preocupo é que não tem ninguém para assumir a responsabilidade
e definir uma política de comunicação para o governo – e isso vai muito além de
tuítes, que são fundamentais, ou ações em redes sociais.

Que mais esse episódio sirva para convencer as pessoas que está
passando da hora de definir uma política de comunicação para o Governo Bolsonaro.

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