Alguém já acompanhou, enquanto torcedor, a cobertura esportiva no rádio? São horas e mais horas falando a mesma coisa
Durante anos trabalhei como repórter de campo e, ainda hoje quando nem escuto mais transmissões esportivas pelo rádio, lembro da mesmice das perguntas quase que ritualísticas que se faziam antes dos jogos, no intervalo das partidas e naquela resenha de fim de evento. Era sempre o mesmo blábláblá de como estão para o jogo, como foi o primeiro tempo e, por fim, o que ficou de lição…
Mas dentro deste processo de repetição há também um processo de realimentação – porque a torcida quer saber, mesmo que já saiba como será a resposta. Se antes era comum escutar que nada mais velho do que o jornal de ontem, hoje pode-se dizer que não há nada mais velho do que as notícias de amanhã – porque por simplismo ou necessidade ideológica, será sempre repisado o mesmo conjunto de obviedades.
Trocando do campo para a política, onde os jornalistas se transformaram em torcedores ou, no melhor dos casos, em porta-vozes de torcidas, estamos observando o mesmo roteiro de perguntas óbvias por parte dos entrevistadores. É como se seguissem um roteiro de obviedades, um manual adrede preparado com o intuito de realimentar o noticiário não com novidades, mas com mais do mesmo – como forma de ir requentando notícias, no afã de buscar cliques e views.
Realimentar o noticiário não por uma nova informação, mas pela própria reinvenção da realidade. Mais do que “andar pra frente”, o que conta é ficar parado em uma posição onde jornalista/torcedor e leitor/torcida se sintam contemplados.
Salvo engano, creio que os fatos da vida cotidiana perderam a relevância pela instantaneidade da informação. Não sou saudosista, mas havia um filtro depurador – jamais confundir com auto-censura – no ato de entender que nem tudo que acontece é informação.
A necessidade de preencher e de alimentar a gula da patuleia me remete a uma história que escutei em 1983 contada por um colega de redação no Jornal de Santa Catarina, na época ainda de Blumenau. Como era o tempo das cheias do Itajaí Açu, as opções de alimentação eram poucas. Depois de dois os três dias com a mesma rotina de sanduíches, eis que ele filosofa: ainda bem que hoje não será pão – queijo e salame. Diante do olhar incrédulo, ele completou: hoje é pão, margarina, salame e queijo.
É assim que eu vejo boa parte do jornalismo nos dias de hoje: sempre o mesmo sanduiche, por vezes alguma margarina para tapear a torcida que fica apreensiva em encontrar razões para, no pós jogo que hoje vivemos, discutir e ter a sensação de se manter viva.
Confrontado com as live e com a instantaneidade das redes sociais, o jornalismo definitivamente ainda não conseguiu encontrar o seu modo de ser, optando por se restringir cada vez mais a guetos obscuros onde sobrevive do aplauso fácil.
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